segunda-feira, dezembro 29, 2025
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Caso Banco Master: mercado teme crise de olho na acareação

Após Toffoli manter o BC na audiência que vai colocar frente a frente os envolvidos no escândalo, especialialistas vislumbram crise

O mercado financeiro que, costumeiramente, encerra o ano sem sobressaltos, entra na última semana de 2025 sob a expectativa quanto ao desenrolar do caso Banco Master. A acareação, marcada para amanhã, pelo ministro do STF, Dias Tóffoli, com a presença de um diretor do Banco Central (BC) poderá desencadear uma crise que, para especialistas ouvidos pelo Correio, não encontra precedentes na história da república, por envolver instituições relevantes dos Três Poderes, incluindo a autoridade monetária.

“Há uma preocupação generalizada, que, sem a menor sombra de dúvidas, gera ruído no mercado. Existe uma pressão do Supremo e até do Tribunal de Contas da União, indagando ao Banco Central. São várias questões que, juntas, podem produzir uma desconfiança no mercado financeiro, sobretudo em função da estabilidade do próprio sistema”, comenta César Bergo, economista, professor de Mercado Financeiro da Universidade de Brasília (UnB).

O Master teve a sua liquidação decretada pelo BC em novembro, após a descoberta de uma fraude estimada em mais de R$ 12 bilhões. O caso, que deveria se restringir ao campo técnico da supervisão bancária e à esfera criminal, migrou para o Supremo Tribunal Federal (STF) e para o Tribunal de Contas da União (TCU), levantando no mercado o temor de que a regulação do sistema financeiro brasileiro esteja sendo contaminada por pressões externas e interesses cruzados.

A tensão se agravou depois que Toffoli determinou uma acareação entre Daniel Vorcaro, dono do banco, o ex-presidente do Banco de Brasília (BRB), Paulo Henrique Costa, e o diretor de Fiscalização do Banco Central, Ailton de Aquino.

Mesmo com os recursos apresentados pela Procuradoria Geral da República (PGR) e pelo próprio BC, Tóffoli manteve a audiência, que pretende confrontar versões sobre a tentativa de venda do Master ao BRB e sobre a atuação do BC na supervisão da instituição. No sábado, após arguição do BC, o ministro deixou claro que nem o regulador nem o diretor Aquino são investigados.

Para o mercado, no entanto, o gesto tem peso simbólico inédito: pela primeira vez, uma decisão típica de autoridade regulatória, a liquidação de um banco por risco sistêmico, é colocada sob julgamento direto do Supremo. “Existe um risco real de o país entrar em uma crise sistêmica, talvez incontrolável”, observa o analista político André César, da Hold Assessoria Parlamentar.

“Não houve, na história da República, um evento que tenha colocado tantos atores, de todos os Podres em um balaio só”, completa, recordando que, ao construir sua trajetória bilionária, Vorcaro envolveu agentes públicos e políticos das mais diversas linhagens. “É bom lembrar que o ex-governador da Bahia, Rui Costa, com quem Vorcaro desenvolveu um projeto anos atrás, ocupa, hoje, a sala ao lado da Presidência da República”, comenta, referindo-se ao ministro da Casa Civil de Luiz Inácio Lula da Silva.

Mas ele também cita que a rede de apoios políticos de Vorcaro foi sustentada especialmente na direita e no Centrão, formanado um emaranhado de interesses que envolve também parlamentares, como o ex-senador e atual presidento do Partido Progressista, Ciro Nogueira.

No Judiciário, César e Bergo citam o ineditismo do envolvimento de dois ministros do STF: o próprio Tóffoli, que havia decretado sigilo no caso, depois de viajar de carona em um jatinho junto com advogados do banqueiro, e Alexandre de Moraes. “Vorcaro conseguiu amarrar até Moraes nesse caso, ao fechar um contrato milionário com a esposa dele”, comenta André César.

Até o ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) Jhonatan de Jesus entrou no caso, ao cobrar do Banco Central explicações formais sobre a cronologia e os fundamentos da liquidação, sugerindo precipitação.

Já no STF, Toffoli disse que é preciso ter pressa, enquanto a PGR afirma ser precipitado usar o instrumento da acareação sem a existência de depoimentos.

Para os analistas, colocar o diretor de Fiscalização do BC frente a frente com investigados por crimes financeiros desloca o foco do crime para o regulador, ainda que o despacho do ministro, publicado no sábado, diga que não. “Em tese, o Banco Central tem o instrumental necessário para enfrentar esse confronto. Mas, no mínimo, está colocada uma crise de credibilidade generalizada, que inclui todas as instituições, inclui a autoridade monetária e até a imprensa brasileira”, pontua César, referindo-se à polêmica em torno da jornalista Malu Gaspar, de O Globo.

Em sua coluna, Malu descreveu contatos entre o ministro Moraes e a cúpula do BC. Segundo a colunista, o ministro procurou o presidente do BC, Gabriel Galípolo, para interceder em favor do Master. Não há, porém, confirmação dessas pressões, o que provou reações e críticas de outros jornalistas.

Fim de ano

Para o economista César Bergo, o fato de a acareação ter sido marcado para o último dia últil do ano poderá arrefecer as reações do mercado. “No dia 30, o mercado financeiro praticamente não trabalha, embora oficialmente tenha pregão e as instruções financeiras estejam funcionando. Mas já será o último dia do ano, porque 31 não o mercado não funciona. Vai reabrir no dia 2 e a repercussão pode ser negativa, dado o resultado que advir desse dessa acareação”, opina.

O pano de fundo é uma guerra aberta de lobbies. Grandes escritórios de advocacia que atuam em Brasília mobilizaram aliados no Congresso, no Judiciário e em órgãos de controle para defender Vorcaro e atacar o Banco Central. Parte da elite política e financeira entrou no jogo. Um banqueiro, segundo fontes do setor, critica Moraes publicamente, mas evita confrontar Toffoli, que tem em mãos o poder de anular a liquidação do Master. Ao mesmo tempo, a maior parte da grande finança se alinhou ao BC e divulgou nota de apoio à autoridade monetária, temendo que a politização do caso crie um precedente perigoso para a fiscalização bancária.

A fabricação de créditos inexistentes, os negócios com o BRB, o envolvimento de fundos de pensão estimulados por governos estaduais e Para gestores de risco, se a liquidação for revertida, o dano será estrutural: investidores passarão a duvidar da capacidade do regulador de agir sem interferência, elevando o custo do crédito e corroendo a confiança no sistema financeiro brasileiro.

Enquanto isso, a acareação no STF tornou-se um ponto de inflexão. Ela não decidirá apenas quem mentiu ou quem disse a verdade sobre a venda frustrada do banco, mas também se o Brasil preservará a linha que separa a técnica regulatória da política judicial. No meio do fogo cruzado, o Banco Central, peça-chave para a estabilidade econômica, tornou-se alvo de uma disputa que vai muito além do destino de um único banco.

Fonte: Por Edla Lula e Alícia Bernardes – 29/12/2025

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